Adeus, Lima…
Após 1000 dias é chegada a minha hora de partir. Adeus falésias de Barranco, adeus pôr-do-sol no Oceano Pacífico, adeus escritório com vista. Adeus buzinas incessantes pelas ruas, adeus trânsito mais desorganizado que já vi na vida, adeus dias cinzas infinitos de inverno, adeus umidade empoeirada de um deserto à beira do mar.
Nossa relação não foi de amor à primeira vista, na verdade não foi uma relação constante de amor. Eu resisti muito, e você resistiu de volta, obedecendo à risca todas as leis da física. Eu não te escolhi e você não me escolheu, mas o destino nos colocou juntas porque tínhamos uma missão. Muito mais você em mim, dada a minha pequenez e falta de habilidade em causar um impacto maior em você. Mas você, você revirou a minha vida do avesso, me deu e me tomou tudo repetidas vezes.
Lima, a nostalgia da despedida me faz ver tantas coisas que a teimosia do dia-a-dia cegou. Andar pelas suas ruas pela última vez, encontrar as poucas e preciosas amizades pela última vez (enquanto moro aqui, porque sei que as encontrarei ainda repetidas vezes pela vida), comer o seu tempero pela última vez. O seu tempero…
Este tempero que não tem gosto de casa, mas tem gosto de vida! Que não lembra a infância, mas abre todas as portas para o novo mundo em que eu vivo agora. Não sei se saberei viver sem seu tempero…
Sim, eu saberei. Como a gente sempre sabe viver a próxima etapa da vida, por mais improvável que ela pareça. Você parecia improvável de suportar naqueles primeiros dias. Você era longe demais, solitária demais, exótica demais, exigente demais. Naqueles dias em que eu andava ao mesmo tempo maravilhada e assustada e te perguntava: o que eu vim aprender aqui? Porque eu não consigo entender?
Nos últimos dias está tudo claro, Lima. Sem prometer você me ensinou tanto, tanto, que eu acho que apenas começo a ver tudo o que você me deu. É o momento de dizer obrigada!
Obrigada por me ensinar a trabalhar remotamente, e a ser produtiva, e a ser organizada com as tarefas e a planejar com antecedência. Obrigada por me apresentar a espiritualidade, mesmo que o custo tenha sido viver no limite por tanto tempo, obrigada. Por me ensinar que a paz eu só encontrarei dentro de mim, e que só poderei viver nela quando ela não dependa de onde eu estou.
Obrigada por me ensinar uma das variações mais bonitas do espanhol. Obrigada por me ensinar a gostar de ceviche e frutos do mar, e obrigada mais ainda por me motivar a ser vegetariana e já não querer comer nada disso. Obrigada por me acolher em um lugar tão lindo e cheio de personalidade como o distrito de Barranco.
Obrigada por ter me dado poucas e tão boas amizades. Obrigada por ter tentado me dar tantas outras, que eu fui distraída demais para cultivar. Obrigada por, com isso, me ensinar que qualquer novo lugar onde eu passe algum tempo, só se sentirá como casa se eu me esforçar para cativar pessoas que compartilham este pedaço de suas jornadas comigo.
Obrigada por me afastar de tudo o que eu mais gostava, para que eu pudesse aprender o que realmente importa para mim e encontrasse meu caminho de volta. Obrigada por ter tido paciência comigo nos meus dias mais rabugentos e saber me ganhar sendo apenas o que você é.
Lima, neste momento eu sinto uma mistura de alívio pelo dever cumprido, e de saudade antecipada de você. Saudade do Quiche de Alho Poró da Bodega Verde, das noites de Microteatro, de assistir ao pôr-do-sol no Malecón em Barranco. Saudade dos Waffles do El Bigote, e do cardápio inteiro do Veda, e da vista do meu escritório. Saudade da feirinha orgânica de Barranco, e até de pegar metropolitano para ir ao trabalho (de quando ele está lotado eu não estou sentindo saudade não, tá?). Saudade de caminhar pela Casas & Cosas, mesmo sem comprar nada, ou de visitar o Museo de Arte Contemporaneo. Ah… as noites dos museus! Que saudade!
Saudade dos chás Grandmas Garden, e do Lugar de la Memoria, e do Museo Larco. Ah, falando em comida, ainda não consegui lidar com a saudade que vou sentir do nhoque de camote com nozes caramelizadas do La Nacional (será minha refeição de despedida!).
Saudade das segundas-feiras de jazz no La Noche Barranco e um pouquinho de raiva de não ter aproveitado melhor. Também vou sentir saudade da pizza com borda de quinoa do Mamma Tomato.
Obrigada, Lima. Obrigada por ter sido tão intensa em minha vida, por ter me provocado todos os sentimentos mais contraditórios e reveladores. Obrigada até pelo que eu ainda não conheci, assim eu posso ter desculpa para voltar.
Ai, Aninha! Me tirou lágrimas… Talvez outros leitores não entendam essa nostalgia misturada com o desespero vivido em alguns momentos. Eu te entendo, e me alegro por você ter resistido muito além de um periodo de “gestação” (risos…)
Lima te trouxe amizades longínquas também, co.o eu.
Estou certa que vou te encontrar muitas vezes pelas trilhas do turismo, pelo mundo.
Vá feliz pois você merece!
Um abraço doce, com sabor do chocolate Rapa Nui.
Ai, amiga! Que palavras mais lindas e doces! Você é o máximo! Sim, aguentei a gestação e ainda fiquei mais um ano! hehe Mas não seria quem eu sou hoje se não fosse esta experiência, então, valeu a pena demais! E sim, os amigos que ganhei foram o melhor de tudo isso! Abraço forte, nos vemos em breve, né?
Que lindo, Ana! Sucesso nas suas novas etapas!